Em mais uma reviravolta da recuperação judicial do Grupo Itapemirim, o juiz Paulino José Lourenço, titular da 13ª Vara Cível Empresarial de Recuperação Judicial e Falência de Vitória, que cuida do caso, decidiu sair do julgamento do processo.
A decisão foi motivada por uma reclamação disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), formulada pelo fundador e ex-sócio do grupo, Camilo Cola. O magistrado também afirmou ver uma “sensível falta de condições institucionais” para continuar nos autos.
Com dívidas trabalhistas e com fornecedores de R$ 336,49 milhões, além de um passivo tributário de R$ 1 bilhão, o Grupo Itapemirim entrou em recuperação judicial em março de 2016.
O substituto legal é a juíza Débora Ambos Corrêa da Silva, que vai decidir se vai julgar ou não o processo da companhia.
R$ 336,4 milhões
Era o montante das dívidas quando a empresa entrou em recuperação judicial
A reclamação cita o juiz Paulino, o desembargador Jorge do Nascimento Viana, membro da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça – onde os recursos do caso Itapemirim são julgados – e uma servidora também da 4ª Câmara, além do ex-assessor jurídico da empresa, Rômulo Barros Silveira, e o administrador judicial Jerry Edwin Ricaldi Rocha.
O documento já foi apreciado pelo ministro João Otávio de Noronha, corregedor nacional de Justiça, que decidiu não afastar os citados, mas determinou um prazo de 15 dias para que os acusados se defendam.
Na petição inicial, Camilo Cola alega a existência de conluio entre o juiz Paulino, o juiz aposentado Rômulo Silveira, que era assessor jurídico da Itapemirim até o último dia 5, e o administrador judicial Jerry Rocha – que não atua no caso. Paulino e Rômulo manteriam relação íntima e Jerry seria o braço financeiro do grupo e indicado como administrador judicial em centenas de recuperações pelo juiz Paulino.
Segundo a reclamação, Jerry receberia valores de Rômulo, amigo íntimo do juiz Paulino, que passaria a proferir decisões em favor de Rômulo. Além disso, os filhos de Jerry e de Paulino seriam sócios ocultos em empresa de advocacia.
O juiz da 13ª Vara encontraria “guarida” na segunda instância, já que a chefe de secretaria da 4ª Câmara Cível, Bruna Stefenoni Queiroz Bayerl de Lima, é esposa de Gustavo Bayerl Lima, advogado da Itapemirim.
Portanto, diz a peça, Rômulo receberia informações privilegiadas das decisões do desembargador Jorge do Nascimento Viana, que tomaria decisões céleres e favoráveis ao grupo.
“Camilo Cola não acusa ninguém. Meu cliente trouxe informações para o CNJ investigar, pois há coincidências e fatos estranhos”, disse o advogado de Cola, José Carlos Stein Júnior.
“ABSURDAS”
Ontem, o juiz Paulino Lourenço proferiu despacho em que se defendeu das acusações ponto por ponto. Segundo ele, a peça “traz acusações absurdas, destinadas exclusivamente a provocar estrépito (barulho)”.
O magistrado apresentou certidões e informou que não há nenhum processo em que ele nomeou Jerry como administrador judicial ou perito. O juiz ainda afirmou que não tem relação próxima com Rômulo Barros Silveira e pontuou que não recebeu valores.
ENTENDA
Recuperação judicial
O que é?
É uma medida para evitar a falência de uma empresa, pedida quando a companhia perde a capacidade de pagar suas dívidas. A empresa continua funcionando, e mantém o emprego dos trabalhadores e o interesse dos credores (que querem ser pagos).
Como funciona?
Ao entrar na Justiça com o pedido de recuperação, a empresa tem que apresentar um plano de como sairá da crise. Nesse plano, ela diz aos credores como é que as dívidas serão pagas, em qual prazo e como irá gerar caixa para fazer isso.
Assembleia de credores
Esse plano precisa ser aprovado em uma assembleia de credores marcada pela Justiça.
Quem acompanha?
Um administrador judicial é nomeado pelo juiz como intermediador entre a empresa, os credores e a Justiça. A empresa precisa apresentar um balanço mensal para prestar contas ao juiz e aos credores.
E se o acordo não for cumprido?
Caso a empresa não cumpra o acordo, o juiz pode decretar a falência da empresa.
O caso da Itapemirim
Pedido
Uma das maiores empresas de transporte rodoviário do país, a Viação Itapemirim, entrou em recuperação judicial em março de 2016, junto com outras empresas que pertenciam à família Cola. O pedido foi protocolado na 13ª Vara Cível Empresarial de Recuperação Judicial e Falência de Vitória, cujo titular é o juiz Paulino José Lourenço.
Dívidas
Na época, a empresa alegou ter R$ 336,49 milhões em dívidas trabalhistas e com fornecedores, além de um passivo tributário de cerca de R$ 1 bilhão.
Viação Kaissara
Antes da recuperação, em junho de 2015, 40% da operação da Itapemirim foi vendida à Viação Kaissara.
Venda
Cerca de 7 meses depois, a família vendeu as empresas recuperandas para um grupo empresarial de São Paulo.
Golpe
Em abril deste ano, o patriarca da família, Camilo Cola, junto com o filho Camilo Cola Filho, afirmaram ter sofrido um “golpe”, alegando que os empresários que compraram a empresa não honraram com o acordo. A família tenta, desde então, anular o negócio.
Dentro da lei
Os sócios da Itapemirim, Camila Valdivia e Sidnei Piva de Jesus, refutaram as acusações e afirmaram que tudo foi feito dentro da lei.
Assembleia de credores
Até hoje, a assembleia de credores do caso não foi marcada. Em dezembro do ano passado, os prazos foram reabertos pois o juiz entendeu que a criação da Viação Kaissara seria uma forma de desviar patrimônio da Itapemirim, incluindo-a na recuperação judicial.